tag:blogger.com,1999:blog-5822212877560623312024-02-20T06:00:47.558-03:00Balaio do João"rio abaixo, rio a fora, rio a dentro — o rio"
Guimarães RosaJoão Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.comBlogger26125tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-66218051475597103952022-12-08T11:00:00.004-03:002022-12-08T11:07:39.660-03:00Te sigo esperando<div style="text-align: left;"><span style="-webkit-text-size-adjust: auto; font-family: UICTFontTextStyleBody; font-size: 17px;">A primeira visão foi aquele navio gigantesco aportado numa tarde cinzenta como são as tardes cinzentas de novembro no Rio de Janeiro. Chovia um pingo fino e irregular. Molha e não molha. A embarcação suntuosa e imponente rasgava do mar calmo até a ponta da primeira nuvem que insistia em molhar.</span><span style="-webkit-text-size-adjust: auto; font-family: UICTFontTextStyleBody; font-size: 17px;"> <br /></span><span style="font-family: UICTFontTextStyleBody; font-size: 17px;">“Me espera embaixo daquele grafite”, ele disse. Na imagem, enviada pelo celular, a vista do navio pra um mural de uma mulher com os cabelos voando e a inscrição: amor e saudade, te sigo esperando. <br /></span><span style="font-family: UICTFontTextStyleBody; font-size: 17px;">Ninguém esperou por ninguém, é verdade. Ele foi pra casa, ele foi pro outro país, depois outro, depois outro. Eu fiquei, mas não esperei também. <br /></span><span style="font-family: UICTFontTextStyleBody;">Ao se aproximar do ponto de encontro, já conseguia enxergar aquele amontoado de gente, e os camelôs em volta. Me lembraram os nossos carnavais pulando pelo Porto, dançando livres e juntos. Me lembrei de quando olhei pra ele, uma vez, com um adereço de flores na cabeça, o sorriso no rosto e cantei: te amo, mi amor.<br /></span><span class="s1" style="font-family: UICTFontTextStyleBody;">Não eram foliões e nem era carnaval. Várias filas de gente se aglomeravam para entrar na embarcação. Andei por um lado e por outro. Não queria esperar.</span></div><p class="p1" style="-webkit-text-size-adjust: auto; font-size: 17px; font-stretch: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span class="s1" style="font-family: UICTFontTextStyleBody;">Um camelô ofereceu uma cerveja. Mas a boca seca e as mãos molhadas de suor impediam qualquer movimento que não fosse esperar.</span></p><p class="p1" style="-webkit-text-size-adjust: auto; font-size: 17px; font-stretch: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span class="s1" style="font-family: UICTFontTextStyleBody;">Atravessei os trilhos do VLT e acabei aguardando obediente e atento por um sinal. “Procure um pontinho rosa na multidão”, orientei. Uma senhora se atrapalhava entre as bagagens e duas crianças. “Mamãe, vou com tia Sônia”, disse uma das crianças ao abandonar a mulher na chuva. Me virei, de repente, e vi o sorriso dele vindo em minha direção. O sorriso vem antes dele, sempre veio. O sorriso dele vem antes de tudo, vem antes dele próprio. </span></p><p class="p1" style="-webkit-text-size-adjust: auto; font-size: 17px; font-stretch: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span class="s1" style="font-family: UICTFontTextStyleBody;">Não sabíamos mais como cumprimentar. Um beijo? Os rostos se atrapalharam, mas as mãos trataram de encerrar um abraço que não abraçava há 2 anos.</span></p><p class="p1" style="-webkit-text-size-adjust: auto; font-size: 17px; font-stretch: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span class="s1" style="font-family: UICTFontTextStyleBody;">“Você está tremendo”, ele disse. “Quero beber uma Original”, completou. O sabor da cerveja de tantos bares que sentamos e de tantas risadas que demos nesses bares. </span></p><p class="p1" style="-webkit-text-size-adjust: auto; font-size: 17px; font-stretch: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span class="s1" style="font-family: UICTFontTextStyleBody;">Olhei nos olhos dele e me vi de novo como não via há algum tempo. Um espelho repleto de penduricalhos de recordação e generosidade aberto só pra mim. </span></p><p class="p1" style="-webkit-text-size-adjust: auto; font-size: 17px; font-stretch: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span class="s1" style="font-family: UICTFontTextStyleBody;">Andamos, fumamos um cigarro, falamos da vida e, enfim, sentamos.</span></p><p class="p1" style="-webkit-text-size-adjust: auto; font-size: 17px; font-stretch: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span class="s1" style="font-family: UICTFontTextStyleBody;">Aqui, a conversa não importava. O que comunicava era o sorriso dele, o mesmo sorriso que a minha memória nunca esqueceu. Como poderia? Na hora, lembrei de quando ele parou de sorrir há 2 anos atrás. </span></p><p class="p1" style="-webkit-text-size-adjust: auto; font-size: 17px; font-stretch: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span class="s1" style="font-family: UICTFontTextStyleBody;">O tempo voou na mesa de bar, e ele tinha que voltar para o barco. Era tripulante daquele monstro atracado no mar, e a hora tornava o reencontro restrito. Restrito e completo, porque, como aprendi, a restrição tornava a saudade ainda mais latente, e o encontro ainda mais leve. </span></p><p class="p1" style="-webkit-text-size-adjust: auto; font-size: 17px; font-stretch: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span class="s1" style="font-family: UICTFontTextStyleBody;">Ele avistou três colegas do sobral de onde sentamos para conversar, beber, fumar e comer pastéis de pernil com abacaxi. “Hey, where are you going?”, ele gritou. </span></p><p class="p1" style="-webkit-text-size-adjust: auto; font-size: 17px; font-stretch: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span class="s1" style="font-family: UICTFontTextStyleBody;">Um dos rapazes esticou a cabeça e me olhou curioso. “Quem era aquele menino, que morou em outra vida daquele colega agora ali sentado tão confortável, mesmo fora de sua cidade natal?” Isso foi o que eu pensei sobre o que o cara pensou. </span></p><p class="p1" style="-webkit-text-size-adjust: auto; font-size: 17px; font-stretch: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span class="s1" style="font-family: UICTFontTextStyleBody;">“A cidade está menos Rio de Janeiro”, ele disse, e eu respondi: “está diferente, mas igual”. Como nós dois. As rugas no rosto mais velho tiraram, enfim, a carinha de moço que ele tinha, mesmo 5 anos mais velho que eu. O olhar curioso nos olhos de peixe ainda estavam intactos. </span></p><p class="p1" style="-webkit-text-size-adjust: auto; font-size: 17px; font-stretch: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span class="s1" style="font-family: UICTFontTextStyleBody;">Ele pagou a conta. Fomos caminhando de volta pro barco.</span></p><p class="p1" style="-webkit-text-size-adjust: auto; font-size: 17px; font-stretch: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span class="s1" style="font-family: UICTFontTextStyleBody;">“Eu preciso levar um açaí pro meu crush brasileiro”, disse. Dei um tapinha na cabeça dele. “Não vai levar nada”, respondi. Rimos. Na entrada pra embarcação, um novo abraço. Dessa vez, a boca não esperou. Já sabiam o caminho uma da outra. Trocamos alguns beijos, felizes. E eu o vi entrar no barco pulando e sorrindo. </span></p><p class="p1" style="-webkit-text-size-adjust: auto; font-size: 17px; font-stretch: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span class="s1" style="font-family: UICTFontTextStyleBody;">Te sigo esperando. </span></p>João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-60318474930298893622013-11-19T01:26:00.000-02:002013-11-19T04:35:13.182-02:00Dona velhinha<div dir="ltr">
Escrevo esta cartinha<br />
Pra uma dona velhinha</div>
<div dir="ltr">
<br /></div>
<div dir="ltr">
Recita Castro Alves<br />
E as belezas do Mato Grosso<br />
Emenda o laço de fita<br />
Com palavra, rima e oração</div>
<div dir="ltr">
<br /></div>
<div dir="ltr">
Na frente da quadrilha<br />
Ele desvelhinha </div>
<div dir="ltr">
<br /></div>
<div dir="ltr">
É clown, é caroço, é coro<br />
Tem na velhinha um espírito em movimento <br />
Uma tela não é nela, na velhinha, que é tempo<br />
Tem nessa velha um doce de canela<br />
Nas memórias rugas</div>
<div dir="ltr">
No fio lisura</div>
<div dir="ltr">
Em Ceci, em Clari, em Drummond</div>
<div dir="ltr">
<br /></div>
<div dir="ltr">
Sentada no banco<br />
Ela desvelhinha</div>
<div dir="ltr">
<br /></div>
<div dir="ltr">
Tem uma velhinha<br />
Que conta historinha<br />
Que conta piadinha<br />
Que fala da vizinha<br />
Que enche a cozinha<br />
De coisinha, canetinha, palavrinha, de inhas, inhos, inas, in <u>braço</u></div>
<div dir="ltr">
<br /></div>
<div dir="ltr">
Chorando no cantinho<br />
Ela revelalinha</div>
<div dir="ltr">
<br /></div>
<div dir="ltr">
Nasci sem nada, nada saber<br />
Hoje não sei só ler<br />
Hoje sei rir<br />
Sei fingir<br />
Sei contar</div>
<div dir="ltr">
<br /></div>
<div dir="ltr">
Nos versinhos da velhinha<br />
Existe eu<br />
Existe o berço <br />
Existe a árvore<br />
E o balanço<br />
Existe a tinta<br />
E a fantasia<br />
Existe Pedro Álvares Cabral<br />
Existe anjo, existe sim<br />
Existe também perversão <br />
Gargalhada inha, zinha, minha, fininha</div>
<div dir="ltr">
<br /></div>
<div dir="ltr">
Escrevo esta cartinha<br />
De fora do cerco da cidade <br />
Do seu netinho, velhinha <br />
Que é saudade<br />
Saudadinha.</div>
João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-15260739537945299802013-11-19T00:45:00.001-02:002013-11-19T00:45:40.206-02:00PagaVem paga de cult<br />
Diz que dá pra Godard<br />
Fala que fode Foucault<br />
Mas não soletra sozinho o sol que sobe a letra<br />
a rima parnasiana<br />
desse clipe<br />
dessa onda<br />
dessa vibe<br />
super simples<br />
super super<br />
superfular supersugarJoão Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-58008472435178216662012-09-22T18:51:00.002-03:002012-09-22T18:58:55.621-03:00AnestesiaQuem não conhece, que me tire a radiografia. Aqueles traços disformes. Azul, lilás, sem cor, sem nada. Aquela chapa de plástico que quer contar a história do meu corpo. Não há nada que ele possa falar. É apenas plástico.
O corpo está ali, parado. Na cama, deitado em lençóis desconhecidos.<br />
A minha pele coça e o cheiro de éter e das flores ao lado da cama só aumentam a sensação de morte. Necrotério. Mas eles chegam e olham, dóceis, doces, doentes. Parentes, amigos, enfermeiros, médicos. Todos assépticos, devidamente limpos de vida. Só restam choro e indiferença.<br />
Até que ela passou e parou:<br />
- Está melhor hoje, meu rapaz?<br />
O corpo queria sorrir, mas eu só queria ficar em silêncio.<br />
- Vai dar tudo certo, eu sei.<br />
Os olhos dela eram diferentes. Não tinham pena, nem tinham dor. Aqueles olhos estavam cheios de luz.<br />
- Obrigado. - respondi.<br />
Ela parou e continuou me olhando. Deixou os panos, vassouras e esfregões, seus companheiros diários, para olhar para mim.<br />
- Eu precisava falar, menino. Precisava dizer isso para você, porque eu sei que vai ficar tudo bem. - a voz dela era antiga, apesar das poucas rugas.<br />
- Quem é você?<br />
- Ninguém.<br />
- Quem é você?
<br />
- Olhe aqui no meu crachá. - disse, estendendo a identificação pendurada no pescoço.<br />
Olhei para o lado. Não queria olhar a foto. Queria os olhos.<br />
- Não quero saber seu nome. Se veio me dar uma boa notícia, diga, pelo menos, quem é você.<br />
Ela olhou como se, finalmente, entendesse. Pegou os seus companheiros diários de ofício, virou as costas e disse, ao fechar a porta:<br />
- Eu sou sensação.<br />
Enquanto ela saia, uma horda de médicos entrou na sala. Um deles falou comigo, enquanto trocava o meu soro.<br />
- Você vai se sentir sonolento.<br />
Vai tudo dar certo.
Ninguém me olhava. Anestesia.João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-53396723365770515082012-01-05T18:45:00.000-02:002012-01-05T18:45:00.533-02:00The few<br />
<div style="background-color: white; color: #222222; font-family: Arial, Tahoma, Helvetica, FreeSans, sans-serif; font-size: 13px; line-height: 26px; margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #0c343d; font-family: Verdana, sans-serif;"><span lang="EN-US">Um presente que eu roubei do <a href="http://thmari.blogspot.com/">blog da Mariana</a>.</span></span></div>
<div style="background-color: white; color: #222222; font-family: Arial, Tahoma, Helvetica, FreeSans, sans-serif; font-size: 13px; line-height: 26px; margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #0c343d; font-family: Verdana, sans-serif;"><span lang="EN-US"><br /></span></span></div>
<div style="background-color: white; color: #222222; font-family: Arial, Tahoma, Helvetica, FreeSans, sans-serif; font-size: 13px; line-height: 26px; margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #0c343d; font-family: Verdana, sans-serif;"><span lang="EN-US">Morning is due to all </span><span class="apple-style-span"><span lang="EN-US" style="background-attachment: initial; background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial;">-</span></span><span lang="EN-US"><o:p></o:p></span></span></div>
<div style="background-color: white; color: #222222; font-family: Arial, Tahoma, Helvetica, FreeSans, sans-serif; font-size: 13px; line-height: 26px; margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #0c343d; font-family: Verdana, sans-serif;"><span lang="EN-US">To some </span><span class="apple-style-span"><span lang="EN-US" style="background-attachment: initial; background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial;">-</span></span><span lang="EN-US"> the Night </span><span class="apple-style-span"><span lang="EN-US" style="background-attachment: initial; background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial;">-</span></span><span lang="EN-US"><o:p></o:p></span></span></div>
<div style="background-color: white; color: #222222; font-family: Arial, Tahoma, Helvetica, FreeSans, sans-serif; font-size: 13px; line-height: 26px; margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #0c343d; font-family: Verdana, sans-serif;"><span lang="EN-US">To an imperial few </span><span class="apple-style-span"><span lang="EN-US" style="background-attachment: initial; background-clip: initial; background-color: white; background-image: initial; background-origin: initial;">-</span></span><span lang="EN-US"><o:p></o:p></span></span></div>
<div style="background-color: white; color: #222222; font-family: Arial, Tahoma, Helvetica, FreeSans, sans-serif; font-size: 13px; line-height: 26px; margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #0c343d; font-family: Verdana, sans-serif;"><span lang="EN-US">The Auroral light.</span><o:p></o:p></span></div>
<div style="background-color: white; color: #222222; font-family: Arial, Tahoma, Helvetica, FreeSans, sans-serif; font-size: 13px; line-height: 26px; margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; color: #222222; font-family: Arial, Tahoma, Helvetica, FreeSans, sans-serif; font-size: 13px; line-height: 18px; margin-bottom: 0cm; margin-left: 0cm; margin-right: 0cm; margin-top: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #444444; font-family: 'Trebuchet MS', sans-serif;"><span lang="EN-US">DICKINSON, Emily. </span><i>A branca voz da solidão</i>. Trad. José Lira. São Paulo: Iluminuras, 2011, p.78-79.</span></div>João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-30779823908433571552010-08-19T15:18:00.006-03:002022-12-08T11:51:13.719-03:00Navegar na Luz<meta content="text/html; charset=utf-8" http-equiv="Content-Type"></meta><meta content="Word.Document" name="ProgId"></meta><meta content="Microsoft Word 10" name="Generator"></meta><meta content="Microsoft Word 10" name="Originator"></meta><link href="file:///C:%5CDOCUME%7E1%5CCliente%5CCONFIG%7E1%5CTemp%5Cmsohtml1%5C01%5Cclip_filelist.xml" rel="File-List"></link><style>
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<div style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; margin: 0cm 0cm 0.0001pt;"><span style="font-size: small;"><span face="Arial,Helvetica,sans-serif">Um conto de Gabo</span></span><br />
<br />
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjWcMroboOjJC02554xxBcE7lU6v-zujRHvsSPxalTz-FP6QtCaWQ88JGydKwUSmy-wm3O9pCC-Uub7zJDJfGanDLMyXRaq0U-iOz1I0-zNk6CX8EJ1_Avz0hyM2HmnbAOdFp8kKam-8Kee/s1600/la+luz.JPG" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjWcMroboOjJC02554xxBcE7lU6v-zujRHvsSPxalTz-FP6QtCaWQ88JGydKwUSmy-wm3O9pCC-Uub7zJDJfGanDLMyXRaq0U-iOz1I0-zNk6CX8EJ1_Avz0hyM2HmnbAOdFp8kKam-8Kee/s400/la+luz.JPG" width="296" /></a><span style="font-size: small;"><span face="Arial,Helvetica,sans-serif"> </span></span><br />
<br />
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<br />
<span style="font-size: small;"><span face="Arial,Helvetica,sans-serif"> </span></span><b><span style="font-size: small;"><span face="Arial,Helvetica,sans-serif"><span style="color: orange; font-size: x-large;">La luz es como el agua</span> </span></span></b><br />
<span style="font-size: small;"><span face="Arial,Helvetica,sans-serif">Gabriel Garcia Marquez</span></span><br />
<br />
<span style="color: #e69138;">Se prefere o conto na versão original, em espanhol,</span><span style="color: #e69138;"> </span><a href="http://balaiodojoao.blogspot.com/p/la-luz-es-como-agua.html" style="color: #e69138;">aqui</a></div><div style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; margin: 0cm 0cm 0.0001pt;">
<br />
<br />
<br />
<div style="color: #e69138;"><span style="font-size: x-small;">Imagens 'roubadas' do <a href="http://www.flickr.com/photos/mr_towers/with/3289412792/">Flickr</a> de <a href="http://www.flickr.com/people/mr_towers/">Omar Andrés Torres Vélez.</a> </span></div><br />
<div style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;"><span style="font-size: small;">No Natal os meninos tornaram a pedir um barco a remos.<br />
— De acordo — disse o pai —, vamos comprá-lo quando voltarmos a Cartagena.<br />
Totó, de nove anos, e Joel, de sete, estavam mais decididos do que seus pais achavam.</span><br />
<span style="font-size: x-small;"><span face="Arial,Helvetica,sans-serif" style="font-size: small;">— Não — disseram em coro. — Precisamos dele agora e aqui.</span><span style="font-size: small;"><br />
</span> <span face="Arial,Helvetica,sans-serif" style="font-size: small;">— Para começar — disse a mãe —, aqui não há outras águas navegáveis além da que sai do chuveiro.</span><span style="font-size: small;"><br style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;" /></span><span face="Arial,Helvetica,sans-serif" style="font-size: small;"> Tanto ela como o marido tinham razão. Na casa de Cartagena de Índias havia um pátio com um atracadouro sobre a baía e um refúgio para dois iates grandes. Em Madri, porém, viviam apertados no quinto andar do número 47 do Paseo de la Castellana. Mas no final nem ele nem ela puderam dizer não, porque haviam prometido aos dois um barco a remos com sextante e bússola se ganhassem os louros do terceiro ano primário, e tinham ganhado. Assim sendo, o pai comprou tudo sem dizer nada à esposa, que era a mais renitente em pagar dívidas de jogo. Era um belo barco de alumínio com um fio dourado na linha de flutuação, </span><br style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;" /><span face="Arial,Helvetica,sans-serif"> <span style="font-size: small;">— O barco está na garagem — revelou o pai na hora do almoço.— O problema é que não tem jeito de trazê-lo pelo elevador ou pela escada, e na garagem não tem mais lugar.</span></span><span style="font-size: small;"><br />
</span> <span face="Arial,Helvetica,sans-serif" style="font-size: small;">No entanto, na tarde do sábado seguinte, os meninos convidaram seus colegas para carregar o barco pelas escadas, e conseguiram levá-lo até o quarto de empregada.</span><span style="font-size: small;"><br style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;" /></span><span face="Arial,Helvetica,sans-serif" style="font-size: small;"> — Parabéns — disse o pai. — E agora?</span><span style="font-size: small;"><br />
</span> <span face="Arial,Helvetica,sans-serif" style="font-size: small;">— Agora, nada - disseram os meninos. — A única coisa que a gente queria era ter o barco no quarto, e pronto.</span><span style="font-size: small;"><br style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;" /></span><span face="Arial,Helvetica,sans-serif" style="font-size: small;"> Na noite de quarta-feira, como em todas as quartas-feiras, os pais foram ao cinema. Os meninos, donos e senhores da casa, fecharam portas e janelas, e quebraram a lâmpada acesa de um lustre da sala. Um jorro de luz dourada e fresca feito água começou a sair da lâmpada quebrada, e deixaram correr até que o nível chegou a quatro palmos. Então desligaram a corrente, tiraram o barco, e navegaram com prazer entre as ilhas da casa.</span><span style="font-size: small;"><br style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;" /></span><span face="Arial,Helvetica,sans-serif" style="font-size: small;"> Esta aventura fabulosa foi o resultado de uma leviandade minha quando participava de um seminário sobre a poesia dos utensílios domésticos. Totó me perguntou como era que a luz acendia só com a gente apertando um botão, e não tive coragem para pensar no assunto duas vezes.</span></span><span style="font-size: small;"><o:p></o:p></span></div></div><div style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; margin: 0cm 0cm 0.0001pt;"><span style="font-size: small;"><span face="Arial,Helvetica,sans-serif">— A luz é como a água — respondi. — A gente abre a torneira e sai.</span><br style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;" /><span face="Arial,Helvetica,sans-serif"> E assim continuaram navegando nas noites de quarta-feira, aprendendo a mexer com o sextante e a bússola, até que os pais voltavam do cinema e os encontravam dormindo como anjos em terra firme. Meses depois, ansiosos por ir mais longe, pediram um equipamento de pesca submarina. Com tudo: máscaras, pés-de-pato, tanques e carabinas de ar comprimido.</span><o:p></o:p></span></div><div style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; margin: 0cm 0cm 0.0001pt;"><span style="font-size: small;"><span face="Arial,Helvetica,sans-serif">— Já é ruim ter no quarto de empregada um barco a remos que não serve para nada.</span><br style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;" /><span face="Arial,Helvetica,sans-serif"> — disse o pai — Mas pior ainda é querer ter além disso equipamento de mergulho.</span><br style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;" /><span face="Arial,Helvetica,sans-serif"> — E se ganharmos a gardênia de ouro do primeiro semestre? — perguntou Joel.</span><br style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;" /><span face="Arial,Helvetica,sans-serif"> — Não - disse a mãe, assustada. — Chega. O pai reprovou sua intransigência.</span><br style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;" /><span face="Arial,Helvetica,sans-serif"> — É que estes meninos não ganham nem um prego por cumprir seu dever — disse ela —, mas por um capricho são capazes de ganhar até a cadeira do professor.</span><o:p></o:p></span></div><div style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;"><span lang="EN-US" style="font-size: small;">No fim, os pais não disseram que sim ou que não. Mas Totó e Joel, que tinham sido os últimos nos dois anos anteriores, ganharam em julho as duas gardênias de ouro e o reconhecimento público do diretor. Naquela mesma tarde, sem que tivessem tornado a pedir, encontraram no quarto os equipamentos em seu invólucro original. De maneira que, na quarta-feira seguinte, enquanto os pais viam <i>O Último Tango em Paris</i>, encheram o apartamento até a altura de duas braças, mergulharam como tubarões mansos por baixo dos móveis e das camas, e resgataram do fundo da luz as coisas que durante anos tinham-se perdido na escuridão.</span></div><div style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;"><meta content="text/html; charset=utf-8" http-equiv="Content-Type"></meta><meta content="Word.Document" name="ProgId"></meta><meta content="Microsoft Word 10" name="Generator"></meta><meta content="Microsoft Word 10" name="Originator"></meta><link href="file:///C:%5CDOCUME%7E1%5CCliente%5CCONFIG%7E1%5CTemp%5Cmsohtml1%5C01%5Cclip_filelist.xml" rel="File-List"></link><style>
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</style> </div><div style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; margin: 0cm 0cm 0.0001pt;"><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi4HW0aDbvHIK64VHGo7Svaivg8s6Gs78-CgbcqP0ezUk9R7IMwRPpgINWdC2UUIi2nuzS3b0JAoUgiXx3T7K7a9p9Z7lHVEXNyJ7XMWu8zf2F3CELn9Fuq22KSFC2ZF1_gyTb3S-PZlkp7/s1600/Luz.JPG" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi4HW0aDbvHIK64VHGo7Svaivg8s6Gs78-CgbcqP0ezUk9R7IMwRPpgINWdC2UUIi2nuzS3b0JAoUgiXx3T7K7a9p9Z7lHVEXNyJ7XMWu8zf2F3CELn9Fuq22KSFC2ZF1_gyTb3S-PZlkp7/s320/Luz.JPG" width="248" /></a></div><span style="font-size: small;"><span face="Arial,Helvetica,sans-serif">Na premiação final os irmãos foram aclamados como exemplo para a escola e ganharam diplomas de excelência. Desta vez não tiveram que pedir nada, porque os pais perguntaram o que queriam. E eles foram tão razoáveis que só quiseram uma festa em casa para os companheiros de classe.</span><br style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;" /> <span face="Arial,Helvetica,sans-serif">O pai, a sós com a mulher, estava radiante. — É uma prova de maturidade — disse.</span><br style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;" /><span face="Arial,Helvetica,sans-serif"> — Deus te ouça — respondeu a mãe.</span><br style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;" /> <span face="Arial,Helvetica,sans-serif">Na quarta-feira seguinte, enquanto os pais viam </span><i style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;">A Batalha de Argel</i><span face="Arial,Helvetica,sans-serif">, as pessoas que passaram pela Castellana viram uma cascata de luz que caía de um velho edifício escondido entre as árvores. Saía pelas varandas, derramava-se em torrentes pela fachada, e formou um leito pela grande avenida numa correnteza dourada que iluminou a cidade até o Guadarrama.</span><o:p></o:p></span></div><div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt;"><span style="font-family: Verdana; font-size: 10pt;"><span face="Arial,Helvetica,sans-serif" style="font-size: small;">Chamados com urgência, os bombeiros forçaram a porta do quinto andar, e encontraram a casa coberta de luz até o teto. O sofá e as poltronas forradas de pele de leopardo flutuavam na sala a diferentes alturas, entre as garrafas do bar e o piano de cauda com seu xale de Manilha que agitava-se com movimentos de asa a meia água como uma arraia de ouro. Os utensílios domésticos, na plenitude de sua poesia, voavam com suas próprias asas pelo céu da cozinha. Os instrumentos da banda de guerra, que os meninos usavam para dançar, flutuavam a esmo entre os peixes coloridos liberados do aquário da mãe, que eram os únicos que flutuavam vivos e felizes no vasto lago iluminado. No banheiro flutuavam as escovas de dentes de todos, os preservativos do pai, os potes de cremes e a dentadura de reserva da mãe, e o televisor da alcova principal flutuava de lado, ainda ligado no último episódio do filme da meia-noite proibido para menores.<br />
No final do corredor, flutuando entre duas águas, Totó estava sentado na popa do bote, agarrado aos remos e com a máscara no rosto, buscando o farol do porto até o momento em que houve ar nos tanques de oxigênio, e Joel flutuava na proa buscando ainda a estrela polar com o sextante, e flutuavam pela casa inteira seus 37 companheiros de classe, eternizados no instante de fazer xixi no vaso de gerânios, de cantar o hino da escola com a letra mudada por versos de deboche contra o diretor, de beber às escondidas um copo de <i>brandy</i> da garrafa do pai. Pois haviam aberto tantas luzes ao mesmo tempo que a casa tinha transbordado, e o quarto ano elementar inteiro da escola de São João Hospitalário tinha se afogado no quinto andar do número 47 do Paseo de la Castellana. Em Madri de Espanha, uma cidade remota de verões ardentes e ventos gelados, sem mar nem rio, e cujos aborígines de terra firme nunca foram mestres na ciência de navegar na luz.</span><o:p></o:p></span></div><div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt;"><i><span style="font-family: Verdana; font-size: 7.5pt;"><br />
</span></i><span style="font-family: Verdana; font-size: 7.5pt;">Dezembro de 1978.</span></div><div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt;"><span style="font-size: xx-small;"><br />
</span></div><meta content="text/html; charset=utf-8" http-equiv="Content-Type"></meta><meta content="Word.Document" name="ProgId"></meta><meta content="Microsoft Word 10" name="Generator"></meta><meta content="Microsoft Word 10" name="Originator"></meta><link href="file:///C:%5CDOCUME%7E1%5CCliente%5CCONFIG%7E1%5CTemp%5Cmsohtml1%5C01%5Cclip_filelist.xml" rel="File-List"></link><style>
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</style><i><span face="Arial,Helvetica,sans-serif" style="font-size: xx-small;"><span lang="EN-US">Texto extraído do livro "Doze contos peregrinos", Editora Record – Rio de Janeiro, 1999, pág. 215, tradução de Eric Nepomuceno. Disponível em: </span></span><span face="Arial,Helvetica,sans-serif" style="font-size: xx-small;">http://www.releituras.com/i_orlando_ggmarquez.asp</span></i><br />
<br />
<span face="Arial,Helvetica,sans-serif" style="font-size: small;"><span face="Arial,Helvetica,sans-serif">Se gostou do conto, vai se apaixonar por essa animação da Série Imaginantes, produzida pela Televisa (México), baseada em "La Luz es como el agua" </span></span><br />
<br />
<span face="Arial,Helvetica,sans-serif" style="font-size: xx-small;"></span><object height="344" width="425"><param name="movie" value="http://www.youtube.com/v/vmv8mFrAB_I?fs=1&hl=pt_BR" /><param name="allowFullScreen" value="true" /><param name="allowscriptaccess" value="always" /><embed allowfullscreen="true" allowscriptaccess="always" height="344" src="http://www.youtube.com/v/vmv8mFrAB_I?fs=1&hl=pt_BR" type="application/x-shockwave-flash" width="425"></embed></object>João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-75317832870963582982010-08-10T15:11:00.001-03:002010-08-10T15:42:26.106-03:00LavagemO véu branco lhe cobria a cabeça. O traje preto lhe cobria o corpo. Uma ave Maria lhe cobria a culpa. Os joelhos, já esfolados, permaneciam firmes como se tivessem raízes naquele chão. Os olhos compenetrados nos olhos da Virgem. <br />
Já era tarde. A outra Irmã que lhe fazia companhia na viagem já dormia há horas. Mas Laura insistia. O terço era parte inerente a ela. E ela continuava suas preces constantes.<br />
A penumbra e o terror invadiam o espaço. Só se via a sombra de Irmã Laura à luz de um candeeiro. À medida que a vela ia se consumindo, o ardor da Irmã aumentava. Seu coração batia forte e sua pele, quente, lateja. Entretanto, ela não vacilava em sequer uma das rezas e seu corpo era como uma estátua, inerte. Nem as gotas de suor que iam escorrendo por baixo de seu vestido, nem a luz que ia se acabando, nem a madrugada pareciam a incomodar. Sua penitência era seu dever. Seu sofrimento era sua redenção.<br />
- Ave Maria cheia de graça...<br />
E não cansava de repetir a prece. Se cansasse, desagradaria a Virgem. Suas palavras firmes ecoavam baixinho pelo aposento apertado. <br />
- Bendita sois vós entre as mulheres. Bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus.<br />
Os ruídos dos carros na rua se confundiam com os sussurros da Irmã.<br />
- Santa Maria, a mãe de Deus, rogai por nós pecadores...<br />
Os punhos alinhados eram pressionados um contra o outro fortemente, como se alguém os tivesse acorrentado.<br />
- ... Agora e na hora de nossa morte.<br />
E a luz acabou. Está Consumado.<br />
- Amém.<br />
Ela então foi se levantando devagar, tentando equilibrar o peso das vestes. Estava limpa de seu pecado, mas embebida em suor. Tateou até encontrar a mesa de cabeceira e acendeu o abajur. Olhou para o lado. Queria tirar as roupas, mas precisava se certificar de que sua companhia não acordaria. “O corpo deve ser coberto para que a ilusão de suas formas não seduza a ninguém” – lembrava de suas palavras naquela manhã. O quarto compartilhado não fora sua decisão. Entretanto a Irmã já estava acostumada a se trocar na penumbra. Temia que fosse ela própria enganada por sua carne nua.<br />
Tirou primeiro o véu encharcado. Apertou-o contra as mãos. Era preciso expurgar o maligno. Abaixou-se para puxar as vestes, então escutou um barulho. Um sussurro de vozes distantes. Gritos de mulher ao longe. <br />
Irmã Laura se apressou até a janela com cuidado para não acordar sua companheira de quarto. Abriu devagar as cortinas. A janela já estava aberta. O vento quente lá de fora soprava contra seus cabelos molhados de suor. Esticou um pouco o pescoço. Já podia ver de onde vinha o barulho.<br />
Três mulheres. Uma loira, duas morenas. A esquina deserta ficava preenchida pela presença delas. Seus corpos delineados pela pouca roupa que vestiam. Seu rosto acentuado pela maquiagem borrada. Irmã Laura, debruçada sobre a janela, acompanhava a cena. Seus olhos seguiram em direção a loira.<br />
Ela estava com uma calça de couro. Um sutiã de lantejoulas pretas completava o figurino. Os olhos dela chamaram a atenção da Irmã. Eram pequenos. Suaves e pequenos. Estavam apertados entre a sombra rosa e os cílios postiços. Mas a Irmã foi capturada por eles.<br />
O suor voltava a escorrer pelo seu corpo. Agora, com muito mais intensidade.<br />
A loira deu uma risada. Alta e vulgar. O olhar de Laura agora estava cativo a boca da mulher. Lábios macios e vermelhos. Vermelhos de batom e de pecado. Era como se a Irmã visse sangue escorrendo pela boca da loira. Sangue impuro, maldito.<br />
Laura estava quente. Sua mão foi até os lábios. E os tocava com lascívia. Sua língua fresca lambia os dedos um por um. O jejum estava quebrado. Em sua boca havia sangue; em seu estômago, a loira; em seu coração, pecado.<br />
Um carro parou bem em frente aquelas mulheres. O vidro foi se abaixando. A loira foi até ele. Tentou olhar para o motorista ainda de pé. Foi se reclinando na janela do carro.<br />
Laura agora penetrava seus olhos na bunda da mulher. A carne comprimida pelo couro. As coxas se batiam uma a outra, enquanto a mulher negociava com o suposto cliente. <br />
Laura desceu suas mãos até suas pernas. Levantou as vestes. Precisa de toque. Precisa segurar seu corpo. Precisa de desejo. Apertou suas pernas e foi deslizando suas mãos por elas. Seus olhos já não olhavam, mas exprimiam sua libido.<br />
As mãos agora apertavam suas nádegas. Todo seu corpo fervia. Ela queria ser desejada. Precisava disso. Sua pele gemia cada vez que seus dedos se atreviam a andar pelo corpo. <br />
E os seus dedos passaram então a dançar. Eles percorriam o corpo de Laura sem rumo. Sua boca começou a soltar gemidos quase mudos. <br />
Laura queria ser como a loira. Desejada. Procurada. Vulgar. Entretanto não havia lugar para inveja. O único sentimento que ela sentia era desejo. E ele a ocupava por completo. Todo seu corpo estava prostrado. As gotas de suor agora a limpavam de outra forma. Não havia mais espaço para pecado. Não havia espaço para santidade. Não havia espaço para mais nada.<br />
O relógio despertou. Depressa, a Irmã correu até o banheiro. As vestes deslizaram a um só movimento. Abriu o chuveiro.João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-68879330844833874562010-04-15T10:21:00.003-03:002022-12-08T11:37:04.696-03:00Receita para o artista<div style="text-align: right;"><span style="color: #f6b26b;">.</span><br />
<span style="color: #f6b26b;"></span><br />
</div><div style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none; border: medium none;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgUU_Y6VvaJM1fcnYAdL-rl0XXvS_0fRoMotLIeaN6WgHU3Xce3lM62Prbc04Oua6ZIiUPBKhswrwzP3iEXwYPmsT-mYAJU7WQW_98Qcg6uaC5N_LQDw8O7B_zXdW5eyj_xVPj5qjNcoOmy/s1600/Aspas.jpg" style="clear: left; cssfloat: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgUU_Y6VvaJM1fcnYAdL-rl0XXvS_0fRoMotLIeaN6WgHU3Xce3lM62Prbc04Oua6ZIiUPBKhswrwzP3iEXwYPmsT-mYAJU7WQW_98Qcg6uaC5N_LQDw8O7B_zXdW5eyj_xVPj5qjNcoOmy/s1600/Aspas.jpg" wt="true" /></a><em>Que</em><em> benefícios nos proporcionam os novos livros! Gostaria que cada dia me caíssem do céu, a cantaros, os livros que exprimem a juventude das imagens. Esse desejo é natural. Esse prodigio fácil. Pois lá em cima no, céu, não será o paraíso uma imensa biblioteca?</em></div><div style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none; border: medium none;"><em>Mas não basta receber, é preciso acolher. É preciso, dizem em uníssono o pedagogo e a dieteticista, "assimilar". Para isso, somos aconselhados a não ler com demasiada rapidez e a cuidar para não engolir trechos excessivamente grandes. Dividam, dizem-nos, cada uma das dificuldades em tantas parcelas quantas darem necessárias para melhor resolvê-las. Sim, mastiguem bem, bebam em pequenos goles, saboreiem verso por verso os poemas. Todos esses preceitos são belos e bons. Mas um princípio os comanda. Antes de mais nada, é necessário um bom desejo de comer de beber de ler. É preciso desejar ler muito, ler mais, ler sempre.</em></div><em>Assim já de manhã, diante dos livros acumulados sobre a mesa, faço ao deus da leitura a minha prece de leitor voraz: "A fome nossa de cada dia nos dai hoje..." "</em><br />
<strong><span style="font-size: x-small;">Gaston Bachelard<em>. A Poética do Devaneio</em>. Tradução de Antonio de Pádua Danesi.</span></strong>João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-19420058794488037122010-04-03T12:37:00.004-03:002010-07-31T14:17:26.138-03:00EnjooA barriga parecia ter vida própria. As contrações dimininuíram progressivamente seus intrervalos até atingirem a uniformidade. Uma única dor. O peito já não tinha ar. Os músculos contraídos enquanto o suor descia. A mulher passava e fingia não ver. "Essa menina aí fingindo que está com dor só pra não me ajudar..." - pensava. O ar escapava dos pulmões tão intensamente quanto da panela de pressão. O tique-taque quase mudo assumia níveis ensurdecedores para Ela. Bem que a mãe tinha avisado sobre o chocolate. Branco e preto envolvidos no crime. A culpa era dos pedaços de caramelo. Correu para o banheiro. Há muito tempo que não vomitava. Da última vez ainda não usava sutiã e tinha a chupeta como objeto de adoração. Era mesmo o chocolate. E junto dele os restos do macarrão do jantar. Todo o banheiro estava sujo. Agora Ela ia ter que ajudar na limpeza.<br />
Saiu do banheiro. A mãe passou e olhou a bagunça. Bradou algumas palavras de reprovação que Ela nãe escutou. Deu à mãe a solução para o delito: voltou ao banheiro com vassoura, um pedaço de pano velho e um vidro com um líquido azul. <br />
O estômago ainda doía, mas Ela bravamente resistia com esfrogões no chão e mordidas no lábio. Mas não se arrependia. Afinal, os doces eram presentes dEle. Ela parou um instante para respirar. Já não aguentava mais as contrações. Sentou no chão molhado e começou a suspirar olhando para o céu azul turquesa entre a janela apertada do banheiro. "Ah, Ele é tão atencioso, tão carinhoso..." - sussurava baixinho. A causa do enjoo era a mesma do suspiro.<br />
- Menina! Está parada porque, hein?! Não viu que ainda está sujo! - gritava a mãe.<br />
Ela fez uma careta secreta aos olhos da mãe e voltou ao trabalho.<br />
- Já até sei. Deve estar pensando naquele menino. Já disse pra você tomar cuidado, menina. Esses meninos são terríveis. Eu já fui adolescente... Meninos dessa idade não querem nada sério. Toma cuidado menina.<br />
Foi aí que Ela teve um susto. Um susto que interrompeu as dores por um instante. As palavras da mãe já eram conhecidas por ela. Mas dessa vez, as circunstâncias eram outras. O enjoo. Ela, então, lembrou do rosto dEle naquela noite. Ele a transmitia segurança e suas palavras começaram a resoar na mente dEla: "Você não vai engravidar... Eu sei o que estou fazendo." Bem que a mãe tinha avisado sobre o menino. Mas não tinha avisado sobre a camisinha. Ele e Ela envolvidos. A culpa era da imprudência? Do impulso da juventude? O fato era que a prova estava ali na frente dela, gosmenta e suja, escorrendo entre os ladrilhos do banheiro.João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-8931263588554339592010-03-12T16:52:00.002-03:002010-07-31T14:11:53.438-03:00O que importaEram pernas. Cheias e macias. Sobre elas deslizavam as meias. Em algodão branco, elas iam desenhando os traços das pernas. Acompanhavam a sinuosa curva da panturrilha até se render ao joelho e suas coxas. Nada mais importava na sala 301 do Colégio São Lucas. As pernas na primeira fila pareciam fulminar o olhar dele. Ele olhava pra outro lado. Desviava. Mas as pernas insistiam em olhar, em penetrar. Até que a dona das pernas se levantou e foi caminhando na direção dele. Ele intimidado se encolhia dentro de si, enquanto Ela se aproximava cada vez mais.<br />
- Professor, posso ir ao banheiro?<br />
- Pode sim...<br />
Ela se virou por um instante, mas depois voltou e perguntou:<br />
- Professor, o senhor não tem vergonha?<br />
- De que? - respondeu assustado<br />
- Veio trabalhar e nem fez a barba.<br />
Ele riu aliviado.<br />
- Mas nem precisa. Não vou cheirar o cangote de ninguém.<br />
- Se você quisesse...<br />
Ela saiu deixando seu rastro de sedução enquanto Ele permanecia inerte. Pelo menos não precisaria mais se preocupar com pernas por alguns minutos.<br />
Ao fundo da sala um mar de sussuros se levantava ao vê-la passar. Meninas e meninos. Não importava. Elas a invejavam, eles a desejavam. <br />
- De volta meninos! - gritou o professor.<br />
Lá fora, ela passeava pelo corredor. Desfilando com a saia ameaçando subir e as meias fingindo secretar seu falso pudor.<br />
Os poucos minutos de tranquilidade na sala 301 se esgotaram com a volta dela e o sinal da saída. No quadro, inumeráveis signos sem nenhum sentido pra Ela. Era o fim de uma tortura de duas horas de Vetores. Todos se espremiam na porta da sala para sair, exceto um aluno que ainda tentava entender os tais números imaginários. Ela saiu sem olhar pra Ele. "Não merecia nenhuma despedida" - pensava.<br />
E lá estavam o professor e o menino. Agora eram os braços dele que olhavam. Os músculos saltando da camiseta apertada. Nada mais importava na sala 301 do Colégio São Lucas a não ser os braços do professor que fuzilavam o menino. As palavras do professor iam se perdendo no espaço enquanto o menino tentava equilibrar o lápis na mão e o seu desejo. Os braços grandes e solitários pareciam procurar alguém para aconchegar. O professor olhou para o menino. Um sorriso desenhava no canto do lábio dos dois. Não era uma cena inédita para nenhum deles. Os rostos foram se encontrando. O menino ainda com os olhos nos braços, e os olhos do professor procuravam os olhos do menino. Os lápis deixados de lado. Os cadernos, os livros, os números. Nada mais importava. Os olhos se fecharam e as bocas se abriram. Os braços finalmente encontraram um abraço e o menino tremia em êxtase. Nada mais importava na sala 301, a não ser o beijo.<br />
Outro dia de aula começava. A mesma desordem de sempre na sala 301. Os mesmo alunos. O mesmo professor de matemática de ontem. Apenas uma coisa estava diferente. Ele segurava um pedaço de papel entre as mãos enquanto olhava para aquela pequena multidão caótica. De novo voltava-se para o papel e lia aquelas palavras para si:<br />
EU SEI DE TUDO.VI VOCÊ ONTEM COM ELE. VI O BEIJO.<br />
Ao fundo da sala, uma risada gratuita brotava dela. Tinha entregue o bilhete diretamente a Ele. Não queria se esconder. Para Ela não importava o segredo. "Se as pernas não tinham conseguido manipulá-lo, o bilhete assim o faria" pensava. Nada mais importava na sala 301 do Colégio São Lucas a não ser a sede dela por controle.João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com6tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-20956145738582783242010-02-25T11:53:00.006-03:002022-12-08T11:40:03.262-03:00Lygia Fagundes Telles e seu por-do-sol<meta content="Word.Document" name="ProgId"></meta><meta content="Microsoft Word 10" name="Generator"></meta><meta content="Microsoft Word 10" name="Originator"></meta><link href="file:///C:%5CDOCUME%7E1%5CCliente%5CCONFIG%7E1%5CTemp%5Cmsohtml1%5C01%5Cclip_filelist.xml" rel="File-List"></link><style>
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<div class="MsoNormal" style="color: #e69138;"><span style="font-family: inherit;">_____________________________________________</span></div><div class="MsoNormal"><span lang="EN-US"><br />
<span style="font-family: inherit;"></span></span></div><div class="MsoNormal"><span lang="EN-US"><span style="color: #e69138; font-family: inherit; font-size: large;"><b>Venha ver o por-do-sol</b></span></span></div><div class="MsoNormal"><span lang="EN-US"><span style="color: #e69138; font-family: inherit;">Lygia Fagundes Telles</span></span></div><div class="MsoNormal"><span lang="EN-US"><br />
<span style="font-family: inherit;"></span></span></div><div class="MsoNormal"><span style="font-family: inherit;"><span lang="EN-US">Ela subiu sem pressa a tortuosa ladeira. À medida que avançava, as casas iam rareando, modestas casas espalhadas sem simetria e ilhadas em terrenos baldios. No meio da rua sem calçamento, coberta aqui e ali por um mato rasteiro, algumas crianças brincavam de roda. A débil cantiga infantil era a única nota viva na quietude da tarde.<br />
<br />
Ele a esperava encostado a uma árvore. </span>Esguio e magro, metido num largo blusão azul-marinho, cabelos crescidos e desalinhados, tinham um jeito jovial de estudante.</span><br />
<br />
<span lang="EN-US" style="font-family: inherit;">- Minha querida Raquel.<br />
<br />
Ela encarou-o, séria. E olhou para os próprios sapatos.<br />
<br />
- Vejam que lama. Só mesmo você inventaria um encontro num lugar destes. Que ideia, Ricardo, que ideia! Tive que descer do taxi lá longe, jamais ele chegaria aqui em cima<br />
<br />
Ele sorriu entre malicioso e ingênuo.<br />
<br />
- Jamais, não é? Pensei que viesse vestida esportivamente e agora me aparece nessa elegância... Quando você andava comigo, usava uns sapatões de sete-léguas, lembra?<br />
<br />
- Foi para falar sobre isso que você me fez subir até aqui? - perguntou ela, guardando as luvas na bolsa. Tirou um cigarro. - Hem?!<br />
<br />
- Ah, Raquel... - e ele tomou-a pelo braço rindo.<br />
<br />
- Você está uma coisa de linda. E fuma agora uns cigarrinhos pilantras, azul e dourado... Juro que eu tinha que ver uma vez toda essa beleza, sentir esse perfume. Então fiz mal?<br />
<br />
- Podia ter escolhido um outro lugar, não? – Abrandara a voz – E que é isso aí? Um cemitério?<br />
<br />
Ele voltou-se para o velho muro arruinado. Indicou com o olhar o portão de ferro, carcomido pela ferrugem.<br />
<br />
- Cemitério abandonado, meu anjo. Vivos e mortos, desertaram todos. Nem os fantasmas sobraram, olha aí como as criancinhas brincam sem medo – acrescentou, lançando um olhar às crianças rodando na sua ciranda. Ela tragou lentamente. Soprou a fumaça na cara do companheiro. Sorriu. - Ricardo e suas ideias. E agora? Qual é o programa?<br />
<br />
Brandamente ele a tomou pela cintura.<br />
<br />
- Conheço bem tudo isso, minha gente está enterrada aí. Vamos entrar um instante e te mostrarei o pôr do sol mais lindo do mundo.<br />
<br />
Perplexa, ela encarou-o um instante. E vergou a cabeça para trás numa risada.<br />
<br />
- Ver o pôr do sol! ...Ah, meu Deus... Fabuloso, fabuloso! ...Me implora um último encontro, me atormenta dias seguidos, me faz vir de longe para esta buraqueira, só mais uma vez, só mais uma! E para quê? Para ver o pôr do sol num cemitério...<br />
<br />
Ele riu também, afetando encabulamento como um menino pilhado em falta.<br />
<br />
- Raquel minha querida, não faça assim comigo. Você sabe que eu gostaria era de te levar ao meu apartamento, mas fiquei mais pobre ainda, como se isso fosse possível. Moro agora numa pensão horrenda, a dona é uma Medusa que vive espiando pelo buraco da fechadura...<br />
<br />
- E você acha que eu iria?<br />
<br />
- Não se zangue, sei que não iria, você está sendo fidelíssima. Então pensei, se pudéssemos conversar um instante numa rua afastada...- disse ele, aproximando-se mais. Acariciou-lhe o braço com as pontas dos dedos. Ficou sério. E aos poucos, inúmeras rugazinhas foram se formando em redor dos seus olhos ligeiramente apertados. Os leques de rugas se aprofundaram numa expressão astuta. Não era nesse instante tão jovem como aparentava. Mas logo sorriu e a rede de rugas desapareceu sem deixar vestígio. Voltou-lhe novamente o ar inexperiente e meio desatento –Você fez bem em vir.<br />
<br />
- Quer dizer que o programa... E não podíamos tomar alguma coisa num bar?<br />
<br />
- Estou sem dinheiro, meu anjo, vê se entende.<br />
<br />
- Mas eu pago.<br />
<br />
- Com o dinheiro dele? Prefiro beber formicida. Escolhi este passeio porque é de graça e muito decente, não pode haver passeio mais decente, não concorda comigo? Até romântico.<br />
<br />
Ela olhou em redor. Puxou o braço que ele apertava.<br />
<br />
- Foi um risco enorme Ricardo. Ele é ciumentíssimo. Está farto de saber que tive meus casos. Se nos pilha juntos, então sim, quero ver se alguma das suas fabulosas ideias vai me consertar a vida.<br />
<br />
- Mas me lembrei deste lugar justamente porque não quero que você se arrisque, meu anjo. Não tem lugar mais discreto do que um cemitério abandonado, veja, completamente abandonado – prosseguiu ele, abrindo o portão. Os velhos gonzos gemeram. – Jamais seu amigo ou um amigo do seu amigo saberá que estivemos aqui.<br />
<br />
- É um risco enorme, já disse . Não insista nessas brincadeiras, por favor. E se vem um enterro? Não suporto enterros.<br />
<br />
- Mas enterro de quem? Raquel, Raquel, quantas vezes preciso repetir a mesma coisa?! Há séculos ninguém mais é enterrado aqui, acho que nem os ossos sobraram, que bobagem. Vem comigo, pode me dar o braço, não tenha medo...<br />
<br />
O mato rasteiro dominava tudo. E, não satisfeito de ter se alastrado furioso pelos canteiros, subira pelas sepulturas, infiltrando-se ávido pelos rachões dos mármores, invadira alamedas de pedregulhos esverdinhados, como se quisesse com a sua violenta força de vida cobrir para sempre os últimos vestígios da morte. Foram andando vagarosamente pela longa alameda banhada de sol. Os passos de ambos ressoavam sonoros como uma estranha música feita do som das folhas secas trituradas sobre os pedregulhos. Amuada mas obediente, ela se deixava conduzir como uma criança. Às vezes mostrava certa curiosidade por uma ou outra sepultura com os pálidos medalhões de retratos esmaltados.<br />
<br />
- É imenso, hem? E tão miserável, nunca vi um cemitério mais miserável, é deprimente – exclamou ela atirando a ponta do cigarro na direção de um anjinho de cabeça decepada.- Vamos embora, Ricardo, chega.<br />
<br />
- Ah, Raquel, olha um pouco para esta tarde! Deprimente por quê? Não sei onde foi que eu li, a beleza não está nem na luz da manhã nem na sombra da tarde, está no crepúsculo, nesse meio-tom, nessa ambiguidade. Estou lhe dando um crepúsculo numa bandeja e você se queixa.<br />
<br />
- Não gosto de cemitério, já disse. E ainda mais cemitério pobre.<br />
<br />
Delicadamente ele beijou-lhe a mão.<br />
<br />
- Você prometeu dar um fim de tarde a este seu escravo.<br />
<br />
- É, mas fiz mal. Pode ser muito engraçado, mas não quero me arriscar mais.<br />
<br />
- Ele é tão rico assim?<br />
<br />
- Riquíssimo. Vai me levar agora numa viagem fabulosa até o Oriente. Já ouviu falar no Oriente? Vamos até o Oriente, meu caro...<br />
<br />
Ele apanhou um pedregulho e fechou-o na mão. A pequenina rede de rugas voltou a se estender em redor dos seus olhos. A fisionomia, tão aberta e lisa, repentinamente escureceu, envelhecida. Mas logo o sorriso reapareceu e as rugazinhas sumiram.<br />
<br />
- Eu também te levei um dia para passear de barco, lembra?<br />
<br />
Recostando a cabeça no ombro do homem, ela retardou o passo.<br />
<br />
- Sabe Ricardo, acho que você é mesmo tantã...Mas, apesar de tudo, tenho às vezes saudade daquele tempo. Que ano aquele! Palavra que, quando penso, não entendo até hoje como agüentei tanto, imagine um ano.<br />
<br />
- É que você tinha lido A dama das Camélias, ficou assim toda frágil, toda sentimental. E agora? Que romance você está lendo agora. Hem?<br />
<br />
- Nenhum - respondeu ela, franzindo os lábios. Deteve-se para ler a inscrição de uma laje despedaçada: - A minha querida esposa, eternas saudades - leu em voz baixa. Fez um muxoxo.- Pois sim. Durou pouco essa eternidade.<br />
<br />
Ele atirou o pedregulho num canteiro ressequido.<br />
<br />
Mas é esse abandono na morte que faz o encanto disto. Não se encontra mais a menor intervenção dos vivos, a estúpida intervenção dos vivos. Veja- disse, apontando uma sepultura fendida, a erva daninha brotando insólita de dentro da fenda -, o musgo já cobriu o nome na pedra. Por cima do musgo, ainda virão as raízes, depois as folhas...Esta a morte perfeita, nem lembrança, nem saudade, nem o nome sequer. Nem isso.<br />
<br />
Ela aconchegou-se mais a ele. Bocejou.<br />
<br />
- Está bem, mas agora vamos embora que já me diverti muito, faz tempo que não me divirto tanto, só mesmo um cara como você podia me fazer divertir assim – Deu-lhe um rápido beijo na face. - Chega Ricardo, quero ir embora.<br />
<br />
- Mais alguns passos...<br />
<br />
- Mas este cemitério não acaba mais, já andamos quilômetros! – Olhou para atrás. – Nunca andei tanto, Ricardo, vou ficar exausta.<br />
<br />
- A boa vida te deixou preguiçosa. Que feio – lamentou ele, impelindo-a para frente. – Dobrando esta alameda, fica o jazigo da minha gente, é de lá que se vê o pôr do sol. – E, tomando-a pela cintura: - Sabe, Raquel, andei muitas vezes por aqui de mãos dadas com minha prima. Tínhamos então doze anos. Todos os domingos minha mãe vinha trazer flores e arrumar nossa capelinha onde já estava enterrado meu pai. Eu e minha priminha vínhamos com ela e ficávamos por aí, de mãos dadas, fazendo tantos planos. Agora as duas estão mortas.<br />
<br />
- Sua prima também?<br />
<br />
- Também. Morreu quando completou quinze anos. Não era propriamente bonita, mas tinha uns olhos...Eram assim verdes como os seus, parecidos com os seus. Extraordinário, Raquel, extraordinário como vocês duas...Penso agora que toda a beleza dela residia apenas nos olhos, assim meio oblíquos, como os seus.<br />
<br />
- Vocês se amaram?<br />
<br />
- Ela me amou. Foi a única criatura que...- Fez um gesto. – Enfim não tem importância.<br />
<br />
Raquel tirou-lhe o cigarro, tragou e depois devolveu-o<br />
<br />
- Eu gostei de você, Ricardo.<br />
<br />
- E eu te amei. E te amo ainda. Percebe agora a diferença?<br />
<br />
Um pássaro rompeu o cipreste e soltou um grito. Ela estremeceu.<br />
<br />
- Esfriou, não? Vamos embora.<br />
<br />
- Já chegamos, meu anjo. Aqui estão meus mortos.<br />
<br />
Pararam diante de uma capelinha coberta de alto a baixo por uma trepadeira selvagem, que a envolvia num furioso abraço de cipós e folhas. A estreita porta rangeu quando ele a abriu de par em par. A luz invadiu um cubículo de paredes enegrecidas, cheias de estrias de antigas goteiras. No centro do cubículo, um altar meio desmantelado, coberto por uma toalha que adquirira a cor do tempo. Dois vasos de desbotada opalina ladeavam um tosco crucifixo de madeira. Entre os braços da cruz, uma aranha tecera dois triângulos de teias já rompidas, pendendo como farrapos de um manto que alguém colocara sobre os ombro do Cristo. Na parede lateral, à direita da porta, uma portinhola de ferro dando acesso para uma escada de pedra, descendo em caracol para a catacumba.<br />
<br />
Ela entrou na ponta dos pés, evitando roçar mesmo de leve naqueles restos da capelinha.<br />
<br />
- Que triste é isto, Ricardo. Nunca mais você esteve aqui?<br />
<br />
Ele tocou na face da imagem recoberta de poeira. Sorriu melancólico.<br />
<br />
- Sei que você gostaria de encontrar tudo limpinho, flores nos vasos, velas, sinais da minha dedicação, certo?<br />
<br />
- Mas já disse que o que eu mais amo neste cemitério é precisamente esse abandono, esta solidão. As pontes com o outro mundo foram cortadas e aqui a morte se isolou total. Absoluta.<br />
<br />
Ela adiantou-se e espiou através das enferrujadas barras de ferro da portinhola. Na semi-obscuridade do subsolo, os gavetões se estendiam ao longo das quatro paredes que formavam um estreito retângulo cinzento.<br />
<br />
- E lá embaixo?<br />
<br />
- Pois lá estão as gavetas. E, nas gavetas, minhas raízes. Pó, meu anjo, pó- murmurou ele. Abriu a portinhola e desceu a escada. Aproximou-se de uma gaveta no centro da parede, segurando firme na alça de bronze, como se fosse puxá-la. – A cômoda de pedra. Não é grandiosa?<br />
<br />
Detendo-se no topo da escada, ela inclinou-se mais para ver melhor.<br />
<br />
- Todas estas gavetas estão cheias?<br />
<br />
- Cheias?...- Sorriu.- Só as que tem o retrato e a inscrição, está vendo? Nesta está o retrato da minha mãe, aqui ficou minha mãe- prosseguiu ele, tocando com as pontas dos dedos num medalhão esmaltado, embutido no centro da gaveta.<br />
<br />
Ela cruzou os braços. Falou baixinho, um ligeiro tremor na voz.<br />
<br />
- Vamos, Ricardo, vamos.<br />
<br />
- Você está com medo?<br />
<br />
- Claro que não, estou é com frio. Suba e vamos embora, estou com frio!<br />
<br />
Ele não respondeu. Adiantara-se até um dos gavetões na parede oposta e acendeu um fósforo. Inclinou-se para o medalhão frouxamente iluminado:<br />
<br />
- A priminha Maria Emília. Lembro-me até do dia em que tirou esse retrato. Foi umas duas semanas antes de morrer... Prendeu os cabelos com uma fita azul e vejo-a se exibir, estou bonita? Estou bonita?...- Falava agora consigo mesmo, doce e gravemente.- Não, não é que fosse bonita, mas os olhos...Venha ver, Raquel, é impressionante como tinha olhos iguais aos seus.<br />
<br />
Ela desceu a escada, encolhendo-se para não esbarrar em nada.<br />
<br />
- Que frio que faz aqui. E que escuro, não estou enxergando...<br />
<br />
Acendendo outro fósforo, ele ofereceu-o à companheira.<br />
<br />
- Pegue, dá para ver muito bem...- Afastou-se para o lado.- Repare nos olhos.<br />
<br />
- Mas estão tão desbotados, mal se vê que é uma moça...- Antes da chama se apagar, aproximou-a da inscrição feita na pedra. Leu em voz alta, lentamente.- Maria Emília, nascida em vinte de maio de mil oitocentos e falecida...- Deixou cair o palito e ficou um instante imóvel – Mas esta não podia ser sua namorada, morreu há mais de cem anos! Seu menti...<br />
<br />
Um baque metálico decepou-lhe a palavra pelo meio. Olhou em redor. A peça estava deserta. Voltou o olhar para a escada. No topo, Ricardo a observava por detrás da portinhola fechada. Tinha seu sorriso meio inocente, meio malicioso.<br />
<br />
- Isto nunca foi o jazigo da sua família, seu mentiroso? Brincadeira mais cretina! – exclamou ela, subindo rapidamente a escada. – Não tem graça nenhuma, ouviu?<br />
<br />
Ele esperou que ela chegasse quase a tocar o trinco da portinhola de ferro. Então deu uma volta à chave, arrancou-a da fechadura e saltou para trás.<br />
<br />
- Ricardo, abre isto imediatamente! Vamos, imediatamente! – ordenou, torcendo o trinco.- Detesto esse tipo de brincadeira, você sabe disso. Seu idiota! É no que dá seguir a cabeça de um idiota desses. Brincadeira mais estúpida!<br />
<br />
- Uma réstia de sol vai entrar pela frincha da porta, tem uma frincha na porta. Depois, vai se afastando devagarinho, bem devagarinho. Você terá o pôr do sol mais belo do mundo.<br />
<br />
Ela sacudia a portinhola.<br />
<br />
- Ricardo, chega, já disse! Chega! Abre imediatamente, imediatamente!- Sacudiu a portinhola com mais força ainda, agarrou-se a ela, dependurando-se por entre as grades. Ficou ofegante, os olhos cheios de lágrimas. Ensaiou um sorriso. - Ouça, meu bem, foi engraçadíssimo, mas agora preciso ir mesmo, vamos, abra...<br />
<br />
Ele já não sorria. Estava sério, os olhos diminuídos. Em redor deles, reapareceram as rugazinhas abertas em leque.<br />
<br />
- Boa noite, Raquel.<br />
<br />
- Chega, Ricardo! Você vai me pagar!... - gritou ela, estendendo os braços por entre as grades, tentando agarrá-lo.- Cretino! Me dá a chave desta porcaria, vamos!- exigiu, examinando a fechadura nova em folha. Examinou em seguida as grades cobertas por uma crosta de ferrugem. Imobilizou-se. Foi erguendo o olhar até a chave que ele balançava pela argola, como um pêndulo. Encarou-o, apertando contra a grade a face sem cor. Esbugalhou os olhos num espasmo e amoleceu o corpo. Foi escorregando.<br />
<br />
- Não, não...<br />
<br />
Voltado ainda para ela, ele chegara até a porta e abriu os braços. Foi puxando as duas folhas escancaradas.<br />
<br />
- Boa noite, meu anjo.<br />
<br />
Os lábios dela se pregavam um ao outro, como se entre eles houvesse cola. Os olhos rodavam pesadamente numa expressão embrutecida.<br />
<br />
- Não...<br />
<br />
Guardando a chave no bolso, ele retomou o caminho percorrido. No breve silêncio, o som dos pedregulhos se entrechocando úmidos sob seus sapatos. E, de repente, o grito medonho, inumano:<br />
<br />
- NÃO!</span></div><div class="MsoNormal"><span lang="EN-US"><br />
<span style="font-family: inherit;">Durante algum tempo ele ainda ouviu os gritos que se multiplicaram, semelhantes aos de um animal sendo estraçalhado. Depois, os uivos foram ficando mais remotos, abafados como se viessem das profundezas da terra. Assim que atingiu o portão do cemitério, ele lançou ao poente um olhar mortiço. Ficou atento. Nenhum ouvido humano escutaria agora qualquer chamado. Acendeu um cigarro e foi descendo a ladeira. Crianças ao longe brincavam de roda.</span></span><br />
<div style="color: #e69138;"><span style="font-family: inherit;"><br />
</span><br />
<span style="font-family: inherit;"><span lang="EN-US">_____________________________________</span><span lang="EN-US">_____________________________</span></span></div><div style="color: #e69138;"><span lang="EN-US" style="font-family: inherit;"></span></div><div style="color: #e69138;"><span lang="EN-US" style="font-family: inherit;">Acabei de descobrir que existe um curta-metragem desse conto com roteiro e direção de uma cineasta emergente do Paraná, June Meirelles. Tenho que ver esse filme já!</span><br />
<span style="font-family: inherit;"><br />
</span></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhSnuj3tS6jyxyaSCyZ5cpztwJQ3TzDCt-9ZDU-7AOHvmSZxcYx6YL8De_E0J5MucWeWLfPSUqP4Cm0GbBfDK9HmDkhE-SEMN7r7FvzuoYW7xeM-Hb0k5enzcpMXf6El0KxpQV6irBzG-6P/s1600-h/Cartaz_Venha_Ver_O_Por_Do_Sol.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><span style="font-family: inherit;"><img border="0" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhSnuj3tS6jyxyaSCyZ5cpztwJQ3TzDCt-9ZDU-7AOHvmSZxcYx6YL8De_E0J5MucWeWLfPSUqP4Cm0GbBfDK9HmDkhE-SEMN7r7FvzuoYW7xeM-Hb0k5enzcpMXf6El0KxpQV6irBzG-6P/s400/Cartaz_Venha_Ver_O_Por_Do_Sol.jpg" width="282" /></span></a></div><div style="text-align: center;"><span lang="EN-US" style="font-size: x-small;"><span style="color: #e69138; font-family: inherit;">Cartaz do filme "Venha ver o por-do-sol"</span></span><span lang="EN-US"></span><br />
<span lang="EN-US"></span></div></div>João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-35785016325366163342010-02-23T15:54:00.001-03:002010-02-23T15:55:39.299-03:00Canção pra degustarCasca de coco queimado<br />
Eu sei que ela é<br />
Beijo no rosto roubado<br />
Sorriso ensaiado<br />
Acerola do pé.<br />
<br />
Foras tão dentro do olhar<br />
Laranja azeda<br />
Mas sinto o açúcar queimado da polpa<br />
Docinha ela é.<br />
<br />
Foto em livro e em jornal<br />
Não vão encontrar<br />
Fica irritada e se esconde entre as folhas<br />
Única fruta do pé<br />
<br />
Gestos breves e oblíquos<br />
Jabuticabas brilhantes<br />
Tudo escrito num flash de segundos.<br />
Vermelha e preta ela é.<br />
<br />
Casca de coco queimado<br />
Eu sei que ela é<br />
Beijo no rosto roubado<br />
Sorriso ensaiado<br />
Manteiga de Carité<br />
<br />
<br />
<div class="separator" style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none; clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhvh6tESnclxrd71z0HjIoa5FbsE3PLSprg6POIQ1XsFzQyKYVoeA5usM_UP5L125RKUd13YTzcSIqAAO9CiycoodfmIhLSzyDVwE0nTm0jEvJnlw_7ur2PwpFCuF9HdMFqn2zcy3vMDBwj/s1600-h/iasmin.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; cssfloat: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" ct="true" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhvh6tESnclxrd71z0HjIoa5FbsE3PLSprg6POIQ1XsFzQyKYVoeA5usM_UP5L125RKUd13YTzcSIqAAO9CiycoodfmIhLSzyDVwE0nTm0jEvJnlw_7ur2PwpFCuF9HdMFqn2zcy3vMDBwj/s320/iasmin.jpg" /></a></div>João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com9tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-53607364940978928582009-12-17T12:18:00.008-02:002009-12-26T13:02:21.023-02:00Manifesto Patriótico<blockquote style="text-align: right;"><div align="center" style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgPhSDIulWvX9rxe0aP4TyJQRjJ4HFQainAVwKeX6dpPUg5ZhGoZaXFFRehDPK34dsYwMWXMjAGVgG7imdbuZJqqN4JsaqugTAPMTIh6e861LVTkorzpi5WOLRdDDUJ8xPiY3aEPHQiKhI0/s1600-h/brasil.jpg" imageanchor="1" style="cssfloat: left; margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" ps="true" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgPhSDIulWvX9rxe0aP4TyJQRjJ4HFQainAVwKeX6dpPUg5ZhGoZaXFFRehDPK34dsYwMWXMjAGVgG7imdbuZJqqN4JsaqugTAPMTIh6e861LVTkorzpi5WOLRdDDUJ8xPiY3aEPHQiKhI0/s400/brasil.jpg" /></a><br />
</div></blockquote><div style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none;"><br />
</div><div style="text-align: right;"><div style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none;"><em>Minha terra tem palmeiras,</em><br />
</div><div style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none;"><em> Onde canta o Sabiá;</em><br />
</div></div><div style="text-align: right;"><div style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none;"><em>As aves, que aqui gorjeiam, </em><br />
</div><div style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none;"><em>Não gorjeiam como lá.</em> <br />
</div></div><div style="text-align: right;"><div style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none;"><span style="font-size: x-small;"><strong>Gonçalves Dias.</strong> Canção do Exílio</span><br />
</div></div><div style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none;"><br />
</div>Exaltar o verde-louro latino. A conquista de heróis. As medalhas do passado.. Isso é falar de pátria?<br />
O país que não para de crescer. O ufanismo nacionalista. A defesa das nossas terras. Isso é ser patriota?<br />
Afinal, que heróis? Temos por acaso heróis nessa pátria? Os Pedros príncipes? Não. Os marechais e generais que a mão de ferro subjugaram o país? Não<br />
E que medalhas do passado? A fome e a pobreza histórica? O preconceito racial? A sucessão de injustiças a que os cidadãos passam?<br />
E enfim, que terras? Será o Brasil a nossa terra? Essa terra que, em mãos de poucos, perde seu valor social e serve apenas ao Rei Lucro? Essa terra que é tomada de nossa gente por grande latifundiários? <br />
Que Brasil?<br />
Que pátria?<br />
Não viemos aqui homenagear essa pátria.<br />
Não viemos condecorá-la com Honrarias de araque.<br />
Falaremos de outra pátria. <br />
A pátria do samba.<br />
A pátria dos morros.<br />
A pátria do sertanejo.<br />
O Brasil amazônico.<br />
O Brasil de bombachas.<br />
Pra nós essa é a pátria que merece homenagens. É o nosso Brasil, que mesmo com inúmeros problemas e adversidades é o lugar feito especialmente pra nós.<br />
É o lugar onde podemos chamar de lar. É onde nos sentimos acolhidos pelos sorrisos abertos e pelo abraço apertado.<br />
Não queremos exaltar o Brasil pela sua grandeza continental ou expressão econômica.<br />
Mas sim pela grandeza de seu povo. Pela determinação da nossa gente. Pela vibração nos estádios de futebol. Pela felicidade em época de carnaval. E fora dela. Pela alegria em nossas praias, nas nossas cidades, em nossas favelas.<br />
Não ao Brasil-Estado. Não ao Brasil de Vargas, dos generais, ou ao país de Lula. Mas sim exaltamos aos verdadeiros filhos desse país. Filhos que tem sim uma mãe gentil, mas que muitas vezes maltratada por bastardos.<br />
Não ao Brasil-empresa, que mantém seu PIB crescendo em detrimento de milhares de famintos. Mas sim ao grande e diverso prato de comida que é o nosso país. Ao colorido dos pássaros. Ao colorido da criança. Ao colorido das festas de frevo.<br />
Não ao Brasil-cartão-postal do Cristo Redentor e das praias nordestinas. Mas sim ao país que alcança sua redenção nos corações pulsantes do seu povo. <br />
E enfim, não ao Brasil-“pacífico e ordeiro”. Não ao povo que se cala. Mas sim a multidão que vai pra rua. Que protesta no twitter. Que está cansada dos monstros profanos da política brasileira. <br />
Para além de um discurso clichê, falar sobre nossa pátria é saudar nossos compatriotas.<br />
Porque o país com que sonhamos é aquele que construímos.<br />
Salve o futuro do Brasil, que hoje leva suas novas asas para casa. <br />
Salve um Brasil além das palmeiras e dos sabiás. Além das aves que gorjeiam.<br />
Porque hoje não gorjeiam apenas aves. Hoje quem grita somos nós.<br />
Hoje não voam apenas sabiás. Mas sonhos de uma juventude com fome de atitudes.<br />
Hoje não apenas palmeiras enfeitam nossa paisagem. Um multicolorido extravasa pelas fronteiras do país.<br />
Essa antropofagia tupiniquim.<br />
Esse lugar definido pela indefinição.<br />
Esse lugar que é um não-lugar<br />
Lugar de todas as culturas que ao mesmo tempo forja sua própria peculiaridade.<br />
E são essas particularidades que fazem daqui o nosso lugar.<br />
<br />
<span style="color: #e69138;"></span><br />
<blockquote><span style="color: #e69138;">Discurso em Homenagem à Pátria da minha colação de grau no Pedro II =) . O texto leva a autoria de Julia Nevares, Tainá Lopes e a minha né... João Victor Barbosa</span><br />
</blockquote><br />
<object height="344" width="425"><param name="movie" value="http://www.youtube.com/v/I6x5jRX085I&hl=pt_BR&fs=1&"></param><param name="allowFullScreen" value="true"></param><param name="allowscriptaccess" value="always"></param><embed src="http://www.youtube.com/v/I6x5jRX085I&hl=pt_BR&fs=1&" type="application/x-shockwave-flash" allowscriptaccess="always" allowfullscreen="true" width="425" height="344"></embed></object>João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-38397569908112421282009-10-31T17:53:00.010-02:002009-11-03T17:18:51.901-02:00Hora de amanhecer<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br />
</div><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgShux5RMCQTftEFMekJqVrUicSW1hMfH3MUEeM4Sv4XfmkiKpbFaErk09pN3Mh4dowFP5wiRt4NwGyTtH_iQtOR4BMRWUO9TLLlGHhYSKxWM8WVq2AdcCCmCsT5AaIV259m6Q0wXuZVYNR/s1600-h/a_persistencia_da_memoria.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgShux5RMCQTftEFMekJqVrUicSW1hMfH3MUEeM4Sv4XfmkiKpbFaErk09pN3Mh4dowFP5wiRt4NwGyTtH_iQtOR4BMRWUO9TLLlGHhYSKxWM8WVq2AdcCCmCsT5AaIV259m6Q0wXuZVYNR/s640/a_persistencia_da_memoria.jpg" vr="true" /></a><br />
<div style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none; text-align: right;"><span style="font-size: xx-small;">As Horas - Salvador Dali</span><br />
</div><div style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none;"><br />
</div><div style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none;">Chega outubro, novembro, e o mesmo se repete. Andiantar os relógios uma hora. Sinal de que a estação do sol está chegando. The sun, the beaches... As 6 da tarde o sol ainda a pino invade os quartos, quebra as cortinas, deita nos rostos.<br />
</div><div style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none;">O horário de verão me incomoda. De uma forma peculiar, mas incomoda. Parece que ao adiantarmos os ponteiros trazemos com esse gesto algo de sobrenatural, um pó mágico, um agitar de varinhas de condão. Um novo cheiro toma conta do ambiente. Cheiro de terra molhada. Cheiro de calor. Um novo clima de luz , de clarividência. Faz as velhinhas conversarem até tarde nas pracinhas. Faz a gente esquecer que existe a noite. A penumbra perde o tesão.<br />
Minha vida escura enfim começa a ser iluminada e começa a irradiar suas cores ainda tímidas nas palavras. O olhar simulado encontrando enfim alguma verdade. Os vestidos soltos e floridos das meninas a desabrochar em botões de margaridas.<br />
</div><div style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none;">Algo que escrevi no início das minhas frustadas tentativas poéticas. Só agora conseguindo entender a beleza e validade desse frasco de perfume:<br />
<br />
Luz<br />
Entra pela janela<br />
Escorre pelos teus olhos<br />
<br />
Num estalo<br />
Rasgo as cores em flores<br />
E entro no seu halo<br />
<br />
Flutuar com os pássaros<br />
Dançar com os anjos<br />
Vivendo e deixando que traga os sonhos<br />
<br />
<div style="text-align: right;">João Victor<br />
</div><br />
</div><div style="border-bottom: medium none; border-left: medium none; border-right: medium none; border-top: medium none;"><br />
</div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgRz6QClFxWdch3kNI3NtpUAp7GhiL9vWs7rKkAU4JbMxaJaTYHjA2KtWthotNE0dSioupZSyTIDArAWm6xX165dVDZiGXQOn2soUwzzTho271PMDeBIPyvM-yQFnQ_zeHvqyBL-vtbd7bT/s1600-h/1233068766649.png" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgRz6QClFxWdch3kNI3NtpUAp7GhiL9vWs7rKkAU4JbMxaJaTYHjA2KtWthotNE0dSioupZSyTIDArAWm6xX165dVDZiGXQOn2soUwzzTho271PMDeBIPyvM-yQFnQ_zeHvqyBL-vtbd7bT/s400/1233068766649.png" vr="true" /></a><br />
</div>João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com10tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-33576050469579638782009-09-07T12:58:00.006-03:002009-10-26T12:59:53.032-02:00Afonso chorouComplicação?<br />
Questionamentos?<br />
Complexidades?<br />
<br />
Minhas mãos suadas entre as suas<br />
Minhas lágrimas no seu rosto<br />
Seu soriso no meu<br />
Simples assim.<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
ps: Te amoJoão Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-982548034926527842009-09-01T21:35:00.005-03:002009-10-26T13:04:04.118-02:00Parabéns, amiga!<i>Texto pra minha melhor amiga. Aniversário de 18 anos! *-*</i><br />
<br />
Toca o telefone. Quem será? Ah, é a Jéssica. Agora já era. Seriam horas e horas falando. Será que poderia medir todas as horas passadas com você no telefone? Eu não consigo mas com certeza a Oi conseguiu e nossas contas telefônicas sempre vinham com pulsos a mais. Fazer o que né!<br />
Desde os primeiros passos. As primeiras palavras rabiscadas no papel. Nossas letras grandes e redondas, nossos corações crescendo e se convergindo. Sempre houve uma afinidade. Pique-esconde, amarelinha e pula corda. Corram todos. Eu sempre era o mais lerdo.<br />
Depois a fase da depressão. Isso mesmo. A grande transição entre a infância e a adolescência. Mas que coisa terrível! Já ouvi várias vezes a insanidade de que adolescência é a melhor fase da vida. Discordo. A melhor fase da vida é a que vivemos. É o presente. É a melhor porque nós estamos a moldando. Com nossas escolhas damos o tom e as colorações, usando tinta que não se pode remover. Voltamos, tentamos apagar o que é inapagável. Mas de que vale apagar? De que valeria remover as tristezas? Se é nelas que crescemos. É nas crises que somos forjados, tenho certeza. E qual não será maior crise do que crescer?<br />
Depois vieram as flores. Com alguns espinhos, de certo, mas de um esplendido amarelo. Um amarelo vivo e eficaz. O primeiro beijo. Os choros pelas paixonites de menina. As brincadeiras. As palhaçadas dos amigos, minha gargalhada fatal, laços que nunca serão quebrados, pessoas que nunca serão esquecidas. E é claro não poderíamos deixar de mencionar as incríveis obras teatrais. É. Isso mesmo. Esse agora que vos fala já foi escritor de peças. E a menina de que discorro aqui minha atriz preferida. A única capaz de interpretar papéis como de uma maluca caipira, Mari mar e uma testemunha ocular de um crime (que era doida também). Acho que tantos papéis bizarros e loucos se devem a capacidade criativa da minha menina. Ah, esqueci de mencionar. Já me apropriei dela. Acho que depois de passadas cerca de 316 palavras já posso chamá-la assim. Minha menina. Enfim, a minha menina teimosa demais, sonhadora de menos. Aprendi com você a colocar os pés no chão. E tento sempre, ainda que com pouco êxito, te ensinar a voar. A observar o céu azul, o vento no rosto e contemplar os raios do sol nascente da nossa trajetória.<br />
Quanta teimosia hein! Quantas trapalhadas! A menina que conquista o motorista, o trocador e o despachante [interna]. As longas viagens. O colégio que mudou por completo o nosso caminho. Não gosto de exaltar instituições, mas seria um erro não mencionar o papel do Pedro II nas nossas vidas. Não como “autarquia do ministério da educação”, mas sim pelas pessoas. Cada professor, cada colega, cada aprendizado. Mais que matemática e português, aprender a subtrair os erros e que amar é um verbo intransitivo. Isso sim. Amar. Apenas amar.<br />
Minhas palavras inexatas, esses rabiscos feitos com tinta e amor são acima de tudo um agradecimento. Obrigado por estar comigo. Obrigado por me apoiar. Obrigado por fazer parte da minha vida. Essa vida tão confusa, tão incerta. Nas nossas incertezas nos complementamos.<br />
Acredito que nada que vivemos foi acaso. Tudo já estava planejado e hoje posso dizer que se voltasse atrás viveria tudo outra vez, porque estou certo que passamos juntos os piores e os melhores momentos. Minha amiga, minha irmã, pra sempre comigo. Você já é uma marca na minha vida e não sei se agüentaria uma abstinência prolongada de você.<br />
Só me resta dizer uma coisa: Te amo! Não o amor dos apaixonados, não o amor das loucuras, também não aquele amor são. O único amor que você considera verdadeiro. O amor dos amigos. O amor dos cúmplices. Te amo, amiga!<br />
Parece que a já é hora de desligar o telefone. Minha mãe me gritou e você tem que ajudar o Rafael com o dever de casa. Desejo que você não cresça, mas cada vez mais seja a menina. A minha menina. Beijos pra ela.<br />
<br />
João Victor<br />
Seu amigo n° 1!João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-61369972072337303612009-08-25T17:37:00.005-03:002009-11-05T17:48:54.392-02:00Querido DiárioAquele beijo molhado<br />
Seu soriso que desvenda<br />
Desvenda meus segredos<br />
Desvenda meu corpo<br />
Descobre minhas fraquezas<br />
Fazem minhas mãos suar<br />
E soa seu brilho<br />
Canta distante<br />
Segue errante<br />
De novo e de volta<br />
E sempre e nunca<br />
Será eterno<br />
Maçã no rosto, maçãs nos lábios<br />
Chuva no rosto, meus lábios nos seusJoão Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-4675517034089138872009-08-01T13:58:00.003-03:002009-08-01T14:01:20.361-03:00A PortaMinha casa não tem janela. Invés de tijolos, pedras. No lugar de luz, escuridão. Aqui o ar é rarefeito. É preciso respirar fundo para enfrentar as terríveis noites. Terríveis e intermináveis. Só se ouvem o estalo do pingo d’água na pedra gelada, gemidos, ecos, vozes sem dono.<br />Na minha casa só há uma porta. A porta de saída. As astes de aço refletidas pela chuva. Os vidros. Espelhos para o mundo. Seria aquilo mesmo real?<br />As cores. Amarelo. Vermelho. Cor púrpura que me paralisa. Quero um vermelho que não seja pecado. Q uero um vermelho velado. Vermelho que não seja sangue. São só imagens. Apenas sonhos. Só conheço um vermelho. Aquele que corre nas veias. De resto tudo é opaco.<br />Ainda que não seja verdade, quero atravessar o portal. Ver a mentira. Ver o oculto. Tocar o impalpável. Respirar a atmosfera dos pássaros. As pedras impendem minha loucura. Uma voz de acusação. Alguém mais aqui? Claro que não. É apenas meu medo querendo me podar. Detesto minha prudência.<br />O sol tímido reflete no vitral da minha salvação. É só abrir. Alguns passos. As mãos frias e molhadas pela ansiedade tocam a fechadura. Mais uma vez as pedras sussurram. Será um aviso? As pedras não falam, não seja fraco. A porta se abre sozinha (ou terão sido minhas mãos apressadas?) Meu corpo não me ouve.<br />Apenas escuto o riso das folhas. Elas me chamam. Dizem meu nome, posso escutar. Os pés vacilam, o vento me empurra. Adeus casa. Adeus pedras. Adeus cinza opaco.<br />O corpo sente o vento contra si. Já não se meche. Olhos abertos para os últimos segundos. Um pensamento de relance: “Terá valido a pena?!” Apenas um milésimo de susto.<br />Não quero morrer sem antes ver os pássaros. Sentir o aroma das frutas. O vento contra o rosto. O vermelho que é verdade. O vermelho das maçãs. Não quero morrer com cinza. Quero morte em vermelho. Sangue vivo molhado pela chuva. Reverenciado pelo Sol. Não vou morrer antes do primeiro suspiro. Pelo menos enquanto caio, vejo um chão que não é pedra. E que o homem ao pó da terra retorne.João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com5tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-35949486425361283352009-07-20T22:24:00.005-03:002009-08-01T14:25:08.638-03:00sweet instant<div align="left"><br /></div><div align="left"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh_dI4nurTUvjF5JObW_oT8pFh7-yPOX4NVAgGvuOAnK1xCG4uNzrG-1X8TiURBjhwH_lZbCdf64yu3lPrPgbWWAXG-Vpi4frlNrCHNw4GQiTqJdSWDWhmDuUcWI_Kimmcslr8jjdpif2qB/s1600-h/OQAAANGZZNGRps3-66vPV6jizH3CRnlQ2ALrIcvlarpQiUwdddWEfnOJviUnt20OmE4rQRAyeV1aJWUouO5ZKy40C5wAm1T1UGEyxCuKIzC7-NuDdNIQVpCQ4Fv0.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5360718975592425378" style="FLOAT: right; MARGIN: 0px 0px 10px 10px; WIDTH: 148px; CURSOR: hand; HEIGHT: 294px" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh_dI4nurTUvjF5JObW_oT8pFh7-yPOX4NVAgGvuOAnK1xCG4uNzrG-1X8TiURBjhwH_lZbCdf64yu3lPrPgbWWAXG-Vpi4frlNrCHNw4GQiTqJdSWDWhmDuUcWI_Kimmcslr8jjdpif2qB/s320/OQAAANGZZNGRps3-66vPV6jizH3CRnlQ2ALrIcvlarpQiUwdddWEfnOJviUnt20OmE4rQRAyeV1aJWUouO5ZKy40C5wAm1T1UGEyxCuKIzC7-NuDdNIQVpCQ4Fv0.jpg" border="0" /></a> Doce que doce<br />Estrelinha do mar<br />Vem me encontrar<br />Vem me ninar<br /><br />Seus olhos brilham<br />Espelhos a sonhar<br />Vou com você<br />Riso, brilho, luar<br /><br />Num quarto escuro<br />Triste a chorar<br />Doce que doce<br />Mais doce a sonhar<br /><br />Nas almofadas<br />Do seu coração<br />Pulo e me aqueço<br />Ao toque das mãos<br /><br />Vejo um clarão<br />Você vai entrar<br />Doce que doce<br />Vem me abraçar<br /></div><div align="right"></div><div align="right"><br /></div><div align="right"></div><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5360720814543550146" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 320px; CURSOR: hand; HEIGHT: 270px; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhzh0VadeAM4mjpOR4XVU1-7r5BTqi_rlLXWnP8Ryp3g9T-cvS__vOLCULq4QJe2QAecPh4XUaD8LyPkyE67nIHHOTIjDJToyKfrS68e12Gpxidp7NOaRtR8O7dcIWMVk8taQl21EnHXubO/s320/OgAAAMOQp7BKvYuN6i4PcpGJoPCg9nBMgJOxVOuU5tbVT8TiUb7FWzTLVGgB5VVSGNs7SZtK2bvVOdw2mjaG-9Lxl1QAm1T1UMQGU9GRlHYv637sBUs3npyO6_Io.jpg" border="0" /> <p align="center"><em><span style="font-size:85%;">Ela: minha inspiração")</span></em></p>João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-50792087590944971172009-07-10T15:22:00.004-03:002010-02-26T14:38:12.766-03:00O NascimentoPrimeira Fisgada<br />
Olhos molhados, vestido molhado<br />
O momento chegou<br />
Panos quentes, lençóis limpos<br />
Papel branco, lápis, livros<br />
<br />
A cada contração um espasmo no rosto<br />
Uma lágrima nasce de seus olhos cansados<br />
Alegria ou dor? Corpo pesado<br />
<br />
O ventre já não lhe basta<br />
Quer ver gente<br />
Quer ser visto<br />
Então sussurra por dentro:<br />
“Deixe sair”<br />
Cada vez que repete essas palavras<br />
Como um mantra sagrado de dor<br />
Um estalo sangrando de amor<br />
<br />
Tudo se contrai e se espande<br />
Um grito mudo<br />
E à luz do mundo<br />
Nasce canção<br />
Nasce grande, forte e valente<br />
Nos braços da progenitora<br />
Chora ela<br />
Chora ele<br />
Sorri a vida<br />
Um sorriso desenhado nos lábios<br />
Toque suave feito lã<br />
Poeta eis aí teu filho<br />
Poesia eis aí tua mãe<br />
<br />
<br />
<div align="right">João Victor</div><div align="right"></div><div align="right"></div><div align="right"><img alt="" border="0" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5356901768874345122" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhRI8_KECrWepzvawQm3qojNaqqrbQk9iREyPF3Pqb2CpWcQiLDuw6be5oS2twkcUP44dlMUsYi6yNlwgSVvdEWYx6lrswMQXWHYEToQh1C4M3fitrLoSDTYqrOme7iv25k7hbmzo7rnb0p/s320/gravidade.bmp" style="cursor: hand; display: block; height: 320px; margin: 0px auto 10px; text-align: center; width: 318px;" /></div><div align="center"><span style="font-size: 78%;">"<em>Maternidade</em>". José Sobral de Almada Negreiros. 1935. óleo sobre tela.</span></div>João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-36038404795986891882009-06-23T19:22:00.008-03:002009-10-25T22:46:03.217-02:00O lobinho nunca mente<object width="320" height="265"><param name="movie" value="http://www.youtube.com/v/34y-Jh9AkhQ&hl=pt-br&fs=1&rel=0"></param><param name="allowFullScreen" value="true"></param><param name="allowscriptaccess" value="always"></param><embed src="http://www.youtube.com/v/34y-Jh9AkhQ&hl=pt-br&fs=1&rel=0" type="application/x-shockwave-flash" allowscriptaccess="always" allowfullscreen="true" width="320" height="265"></embed></object><br />
<br />
<br />
Curta fantástico! Reflexão sobre a vida em 9 minutos...João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com13tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-33843039617675731172009-06-08T20:55:00.004-03:002009-06-09T20:54:03.403-03:00DevaneiosEstar perto<br />Tentar<br />Ouvir blues<br />Comendo chocolate<br />Passar as tardes<br />Brincar nas nuvens<br /><br />Estar de bem<br />Amar a cem<br />Amar sem ter<br />Bem perto<br />Brincar no sol<br /><br />Ser feliz sem barreiras<br />Jogar<br />Se jogar<br />E simplesmente<br />Banhados pelo azul<br />Ser sul, ser norte<br />Acender<br />Apagar<br /><br />A noite é fria<br />A lua é grande e redonda<br />Em torno de nós<br />A cada onda de espuma<br />Apenas o calor<br />As labaredas que nos esquentam<br />E as alamedas verdes vão passando<br />Nos separando<br />Cada um sabe o caminho<br />Sabe o destino <br />Segue sozinho<br />Segue no frio<br /><br /><div align="right">JOão Victor</div>João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com13tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-60693942307614635122009-05-31T18:30:00.008-03:002009-05-31T18:56:15.296-03:00Amenidades<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjX3DeAYC-t8UEEDPI-pXiNEimoyZY0kixBSC6GHAQn0DHtzCf1T8iJSKTjx5kvGSPECJEkY_LoMncUVtfIpQvZze-Gwsw-HoTxpCVqkrmJLl6vD2do7rQ27L58mS0v5LN5vniBgXt3ryVB/s1600-h/borboleta.bmp"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5342109983365930210" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 320px; CURSOR: hand; HEIGHT: 237px; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjX3DeAYC-t8UEEDPI-pXiNEimoyZY0kixBSC6GHAQn0DHtzCf1T8iJSKTjx5kvGSPECJEkY_LoMncUVtfIpQvZze-Gwsw-HoTxpCVqkrmJLl6vD2do7rQ27L58mS0v5LN5vniBgXt3ryVB/s320/borboleta.bmp" border="0" /></a><br /><div><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhIiMJdOBGMVcGrMmV1FQ4aRB_qiJIMgwcgxN730kjeLxbzyy3DMMv2gDaB7olQk-gfqXfU8a9I6gaPvphlJXLV6elJTAiUIL9fq2c-HI-v_5jv-tr04vg5aDH0SHU1UzdHnRIe18jU4Wwi/s1600-h/borboleta.bmp"></a>Hoje uma borboleta invadiu meu quarto<br />Estava escuro<br />Sem vento, nem barulho<br /><br />Hoje uma borboleta entrou pela janela<br />Batendo as asas amarelas<br />Feito pintura em tela<br /><br />Hoje uma borboleta pousou nas minhas cortinas<br />Aguçou minha imaginação<br />Beijando as flores do edredom<br /><br />Um pedido eu fiz a ela<br />À borboleta da janela<br />Voa, voa sobre mim<br />Traga o néctar do alecrim<br />Da petúnia, do jasmim<br />Faz minha casa seu jardim<br /><div></div><br /><div align="right">JOão Victor</div><br /><div align="right"></div><br /><div><span style="font-size:85%;"></span></div><br /><div><span style="font-size:85%;"></span></div><br /><div><span style="font-size:85%;">"Poesiazinha" essa! Com um quê de infância. (risos=)</span></div></div>João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com12tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-87148109865069546442009-05-18T15:43:00.008-03:002022-12-08T11:43:31.788-03:00<div align="right"><span style="font-family: arial; font-size: 78%;"><i><img alt="" border="0" src="http://photos1.blogger.com/blogger/2304/484/1600/foto%20%2823%29.jpg" style="display: block; height: 240px; margin: 0px auto 10px; text-align: center; width: 362px;" />Jongo no Quilombo São José</i></span> <br />
</div><br />
<br />
<span style="font-family: arial;">Estrada de chão<br />
É Pau-a-pique, é São José<br />
Sou quilombola, sim senhor <a href="http://photos1.blogger.com/blogger/2304/484/1600/foto%20%2823%29.jpg"></a><br />
Filho de preto o que é?<br />
<br />
Batuque no escuro<br />
Morena bunita vai tabear<br />
Quero ver quem não vai se juntar<br />
Quando o jongo começar<br />
<br />
IoiÔ canta<br />
Iaiá levanta<br />
Levanta a saia<br />
E entra na dança<br />
<br />
Quem é branco vira preto<br />
Quem é preto vai dançar<br />
Celebrando a liberdade, realidade iludida<br />
Marcada no passo, no sorriso, na batida, no olhar.<br />
<br />
Jogar o charme<br />
Sentir o som do tambor<br />
Jogar o corpo e jongar<br />
Calor<br />
<br />
O dia tá clareando<br />
A fogueira apagou<br />
Fuligem voa no ar<br />
Machado pra terminar</span><br />
<div align="right">JOão Victor<br />
<br />
</div><br />
<a href="http://photos1.blogger.com/blogger/2304/484/1600/foto%20%288%29.0.jpg"><img alt="" border="0" src="http://photos1.blogger.com/blogger/2304/484/1600/foto%20%288%29.0.jpg" style="height: 231px; width: 357px;" /></a><br />
<br />
<br />
<br />
<div align="left"><span style="font-size: 85%;"><span style="font-family: arial;"><i>Situando a poesia:<br />
Passei o sábado e o domingo no Quilombo São José, numa festa que esbanjou alegria e efervescência de cultura</i> afrobrasileira</span><span style="font-family: arial;">. <i>Depois eu ainda vou postar mais sobre o Quilombo</i></span></span><br />
</div>João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com37tag:blogger.com,1999:blog-582221287756062331.post-88308477393937612842009-05-12T19:43:00.002-03:002009-11-05T17:49:37.753-02:00Rabiscos de mim<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjELJ63GKHQa4BmFqnU0L1XMjxyo730XidtvNhGIXKqmAJctxY2xJIsJqA2axzIlG1I4onQZFFWmFEH1kCvI0Ho6PJdPJYM3YHWo9vOj76-SOnEZWndnGlurQ1Ix-iIbNwaMrPL2BLuv74R/s1600-h/osgemeos_Exposi%25C3%25A7%25C3%25A3oMontada_FotoMa%25C3%25ADtaFranco+(61).JPG"><img alt="" border="0" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5335080310575128242" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjELJ63GKHQa4BmFqnU0L1XMjxyo730XidtvNhGIXKqmAJctxY2xJIsJqA2axzIlG1I4onQZFFWmFEH1kCvI0Ho6PJdPJYM3YHWo9vOj76-SOnEZWndnGlurQ1Ix-iIbNwaMrPL2BLuv74R/s400/osgemeos_Exposi%25C3%25A7%25C3%25A3oMontada_FotoMa%25C3%25ADtaFranco+(61).JPG" style="height: 259px; width: 365px;" /></a><br />
<div align="center"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjDtNgWyAsQMGyYGwnHTdhftc1ZI6HnaGuVHrdoJAs0pNlvaSUnUE14dIBgyqKCqCytiLP09ZEVAZiH2l8Vrfqe7MW5Jp08ygGmCKehUQoEZVY3RM_rwd08NaWAYQstiHK7iUlz1_26nTz-/s1600-h/osgemeos_Exposi%25C3%25A7%25C3%25A3oMontada_FotoMa%25C3%25ADtaFranco+(61).JPG"></a><i><span style="font-size: 78%;">Vertigem - OsGêmeos ( no CCBB Rio até o dia 17 de maio. Recomendo)<br />
</span></i><br />
<br />
<span style="font-family: lucida grande; font-size: 130%;">Apaguei<br />
Não mais rosas<br />
Não mais traços<br />
<br />
Rabiscos<br />
E mistos<br />
De grafites<br />
<br />
Figura disforme<br />
contorno insiste<br />
cor resiste<br />
<br />
Grafite<br />
Grite<br />
Risque<br />
Rabisque<br />
<br />
Restam linhas<br />
Linhas tortas<br />
Metamorfas<br />
Palavras?<br />
<br />
Arrisque....<br />
Não pisque<br />
Sou eu<br />
Nada importa<br />
Mas persiste<br />
Nada existe<br />
<br />
Acredite</span><br />
<br />
<div style="text-align: right;"><span style="font-family: lucida grande; font-size: small;">João Victor </span></div><br />
</div>João Mellohttp://www.blogger.com/profile/12387577178833633316noreply@blogger.com4